Opinião

Um grupo de amigos

Por Rubens Amador
Jornalista

Um amigo já é muita coisa. Agora imaginem um grupo de amigos! Que reuniam-se por longo tempo no Clube Comercial, há alguns anos. Éramos sempre os mesmos diariamente, a partir das 14h, 14h30min. Sentíamos imenso prazer de convivermos daquela forma. Sempre tínhamos um assunto novo, ou deixávamos para concluir nossas opiniões - às vezes - no outro dia.

Jamais houve qualquer mal estar, embora pudéssemos discordar às vezes. Nunca jogávamos nada. Nem cartas, nem bilhar, nem sinuca, nem xadrez, nem gamão ou qualquer outra diversão oferecida pelo Clube. Só jogávamos conversa fora. Gostávamos mesmo era de conversar entre um cafezinho e outro naquele canto do Clube. Quando faltava um, logo se telefonava para sua casa procurando saber por que faltara. Às vezes era algo mais severo e a turma passava a se reunir na casa do doente, se tal coisa fosse possível. Éramos vários. Aqui a relação por ordem alfabética: Ayres Marques Dias, Alcides de Mello Calheiros, Fernandes Franco, José Lopes, Mário Luz, Dr .Pedro Costa, Paulo Mendonça, Paulo Gastal Castro, Rubens Amador, Salvador Lemos de Freitas e Silvio Allemand.

Pois neste grupo de amigos aconteceu algo que acabou revelando três caracteres muito bonitos. Algo inesperado: Um dos integrantes começou a enxergar mal. Logo mil conselhos lhe foram dados e ele visitou vários médicos. Mas o seu mal aumentava paulatinamente. Em alguns poucos meses ele foi levado ao mais famoso oftalmologista da Capital. Nós éramos a sua família, pois ele era solteirão. A boa fortuna lhe bafejara, e ele era uma pessoa de recursos financeiros. Voltou de Porto Alegre meio desanimado (podia-se ver), mas mostrando-se corajoso; disse-nos que o médico consultado, à insistência sua, tinha lhe dito que seu problema era seriíssimo, que se tratava de uma doença degenerativa, e que ele iria finalizar perdendo a visão total. Procuramos animá-lo de várias formas. Mas ele negou-se a ir a São Paulo, tal a confiança e crédito que devotava ao grande médico de Porto Alegre, mesmo sabendo que sua visão iria terminar.
Alguns membros do grupo passaram a levá-lo em casa depois que disse que só estava divisando vultos. Mas nunca quis deixar de frequentar o grupo no Clube.Dentre nós, havia um dos nossos que muito se enterneceu com sua situação, e depois que nosso amigo já não podia ir para casa sozinho, internou-se na melhor casa de repouso da cidade, e era esse amigo devotado que o levava e trazia, desinteressadamente, até o Clube todos os dias. Era ele também que se ocupava da logística do amigo já sem visão. Não deixava faltar-lhe nada que desejasse. Nós o visitávamos frequentemente, aos domingos, quando não havia reunião. Nunca ficou só. Mas sua visão se foi totalmente, e ele começou a entristecer.
Em curto espaço de tempo morreu. Ficamos todos muito entristecidos, e as primeiras reuniões sem ele foram difíceis. Mas, disse, este episódio triste revelou três caracteres positivos que deu bem uma amostra do tipo de pessoas que se reunia todos os dias. Passados cerca de três meses, aquele amigo seu, que era muito religioso e bom caráter, e que se condoera demais com a sorte do amigo a quem procurou servir sempre, desinteressadamente, recebe a visita de um sobrinho do infortunado que perdera a visão, e frente ao nosso amigo disse-lhe: "Sou portador de R$ 300 mil, que o tio mandou que lhe entregássemos; o que deixou por escrito através de alguém de sua confiança, e cuja carta aqui está em meu poder, com sua assinatura, para que o senhor a leia."

Nosso amigo agradeceu emocionado o oferecimento, sem se dar conta que naquele momento estavam sendo exaltados pelo destino, três caracteres altamente positivos: o do agraciado, pelo seu bom coração. O gesto do ofertante, deixando ver que foi uma pessoa agradecida; e pelo portador da importância, que se revelava também, ser uma pessoa muito honesta.


Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Anterior

Cara feia

Próximo

O brigadeiro Montenegro

Deixe seu comentário